por Quatermass
Um dos filmes brasileiros que mais prezo. O Pagador de Promessas (1962) supera O Cangaceiro e O Assalto ao Trem Pagador em sua aparente simplicidade.
Na verdade, a história é simples, porém com uma rara carga de aspectos extremamente complexos e dispostos num universo de pessoas aparentemente comuns. Nunca foi anunciado como obra crítica, subversiva, contra o sistema e toda aquela ladainha que a esquerda brasileira adota quando quer promover alguma porcaria cinematográfica. Ao invés, prima pelo singelo – e, por incrível que possa parecer, é exatamente inteligente e toca fundo na ferida.
Leonardo Villar está esplêndido como o inocente e determinado Zé do Burro. Seu objetivo: pagar uma promessa à Santa Bárbara, carregando uma cruz, acompanhado de sua impaciente e incompreensiva esposa (Glória Menezes) até a igreja da santa em Salvador. Sujeito simples e humilde, mas digo novamente, determinado a deixar a cruz dentro da igreja. Em seu caminho está o vigário (Dionísio Azevedo) que além de desdenhar da promessa, impede também acesso a cultos afro, dispersando as baianas do candomblé.
Além da postura excludente e elitista da Igreja, há também os que procuram capitalizar o incidente criando outro: o repórter que induz nosso pagador a responder o que não quer e escrevendo somente o que interessa ao jornal. Agora, Zé do Burro, que além de representante do capeta pela Igreja, também é o Novo Cristo, comunista, à favor da reforma agrária, contra a exploração do homem pelo homem e tantas outras coisas que nunca pensou em ser ou dizer.
O dono do boteco fica feliz com o fato, pois seus negócios melhoraram. O boato vai se agigantando até o triste clímax.
É uma obra rara e que dificilmente o espectador não deixa de manter empatia com Zé do Burro. De burro não tem nada. Burros somos nós, que passados quarenta e seis anos, continuamos vivenciando e sofrendo: carregando uma cruz e sendo manipulados pelos outros!
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