por Quatermass
Gold (Gold – 1934) foi o primeiro filme alemão de ficção científica que, diferentemente de Metrópolis (1927), adotou uma postura contraditória de como fazer filmes: ao aproximar-se da cultura anglo-saxã, afastou-se do cinema expressionista de Fritz Lang (mais precisamente renegou).
Tô falando grego ao cinéfilo? Explico em português: diferentemente do deslumbre visual mudo dos anos vinte, o terceiro filme da trilogia não impressiona, intriga ou imortaliza; ao contrário, é escapismo, dotado de conceitos visuais contemporâneos, um ótimo ator (Hans Albers), cujo personagem (Dr. Werner Holk) abre alas para os filmes do gênero que se seguirão.
Mais, Gold de certa forma está à frente de seu tempo, não por seu conteúdo (esqueça a complexa trama de Metrópolis), mas pela forma de fazer cinema: o convencionalismo introduzido nos anos trinta com o uso do som e da cor, iniciando uma padronização que ingressará no século 21.
Não pretendo com isso diminuir a importância da obra, mesmo porque é praticamente desconhecida do grande público e dotada de um grande estigma: foi um filme produzido durante o regime de Adolf Hitler. Tendo os nazistas recém assumido o poder em 1933, não se vislumbra, de imediato, questões nacionais socialistas.
Pelo contrário, tal como o diretor de O Tunel (1933), Hans Albers também não simpatizava com os ideais nazistas, refugiando-se na América, ainda nos anos trinta. Retornou à Alemanha com o fim da 2ª Guerra Mundial, onde morreu em 1960. Foi um grande ator de seu tempo, porém, esquecido rapidamente com a morte; assim como este filme que havia protagonizado.
Mas afinal, chega de trolóló, e do que trata a obra? Aborda a disputa de cientistas pela transformação de metal em ouro. Não pense o cinéfilo que seja na busca da pedra filosofal ou por via atômica (visto que ainda era uma questão puramente teórica), mas pela eletricidade: uns 15 milhões de volts!
Holk (Albers), assistente do Prof. Achenbach, um dedicado cientista, sobrevive a um acidente no laboratório. Seu rival e principal desafeto é o rico (entenda-se aqui capitalista inescrupuloso) inglês John Wills (mesmo não tendo conteúdo escandalosamente nazista, não pense o ingênuo cinéfilo que os nativos bretões escapariam incólumes).
Holk é cinicamente convidado a participar como engenheiro do gigantesco equivalente inglês, num laboratório construído no fundo do Oceano Atlântico. Apesar de ser quase idêntico ao original alemão, porém em escala muito maior, o gerador não funcionava como deveria, daí a importância de Holk.
Em tempo e foi fato verídico: com o término da guerra, os americanos interrogaram a equipe técnica de Gold, intrigados com a incrível semelhança do gerador com o reator nuclear construído na América dez anos depois!
Com a descoberta da trama que levou a morte do colega alemão e da cobiça de seu anfitrião, se insurge. Resultado: o laboratório é destruído, porém, nosso sincero e valente cientista consegue se salvar e aos demais trabalhadores. Fim! E daí (dirá o nobre internauta)? De que serviu tudo isso? Para que saber do relato de filmes que dificilmente estarão disponibilizados pela maioria da mídia, se é que algum dia virão a estar?
Posso tentar dizer da seguinte maneira: o cinema é um processo evolutivo, que se recicla, alternando períodos de aprendizado, novas técnicas e pessoas. Não é um fenômeno de fácil delimitação, muitas vezes ressurgindo e evoluindo em diferentes países e nunca vinculados a mesma fonte. Se expressa em diferentes gêneros, muitas vezes, de forma subliminar, de acordo com a conjuntura do momento e em razão disso, muitas vezes incompreendidos.
Em assim sendo, volta e meia surgem filmes alemães, Glauber Rocha, Lima Barreto, Douglas Trumbull, Costa-Gavras, Steven Spielberg, Ray Harryhausen, George Lucas, Fritz Lang e tantos outros. E é desta diversidade, como a democracia imperfeita, que o cinema se recria.
Postagens anteriores:
Trilogia alemã sci-fi dos anos 30 - 1a. parte
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