A Ilha Nua (The Naked Island – 1960) é um filme conceitual do diretor japonês Kaneto Shindô.
Se você, caro internauta, for fã dos filmes de Michael Bay e Paul S. Anderson e inadvertidamente assistir pelo menos cinco minutos, corra imediatamente para uma locadora de vídeo, retire os dois Transformers e assista por umas doze horas para desintoxicação: a ação ininterrupta e histérica servirá como contraveneno.
Explico: A Ilha Nua conta a história de uma família pobre de fazendeiros japoneses que teimosamente insiste sobreviver numa rocha árida e cercada de água salgada por todos os lados (mais precisamente no arquipélago Setonaikai, a sudoeste do Japão).
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Nos primeiros trinta minutos nos mostra a sofrida rotina diária da busca por água potável junto ao continente. Para esta empreitada o casal volta e meia se reveza várias vezes por dia junto ao pequeno barco. A água é o bem maior: serve de bebida, banho e como um tosco meio de irrigação. A residência fica no topo da ilha e não é preciso dizer que é mais uma provação chegar até lá!
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Entre a casa e a baía está a plantação. Os dois filhos pequenos do casal ajudam nos afazeres domésticos. E daí? Que mais acontece? Olha! Durante 92 minutos dá-se apenas um drama familiar, facilmente superado ao final, pela teimosa perseverança de lavrador pobre.
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A mensagem do filme: a vida é dura e sem recompensas. Mas então, por que diabos estou falando sobre um filme que aparentemente não tem nada a haver com este blog? Porque é uma obra surreal: é um filme SEM DIÁLOGOS!
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Para tanto Kaneto Shindô se utiliza de várias técnicas para ocultar o lero: a câmera que se afasta, o ingresso dos personagens dentro das casas, e nós, expectadores meramente aguardamos a saída do lado de fora. No entanto, a linguagem é facilmente compreensível e de certa forma universal. A trilha sonora, por sua vez, serve de complemento.
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Entende este comentarista que a obra extrapola o conceito de filme: é poesia. Poesia sem versos, estrofes e rimas. É uma poesia virtual, mais precisamente visual. E é de uma beleza singelamente incomparável. É uma poesia simples e repetitiva, porém, nunca cansativa.
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Este diretor é respeitado no Japão e mundo afora. Continua dirigindo e roteirizando. Mas como bom ocidental que sou, sinto falta de Kurosawa. Adorava seus filmes carregados de diálogos às vezes ferinos, às vezes shakesperianos ou ambos. Adorava seus dramas e aventuras genialmente convencionais e que o Ocidente aprendeu a copiar.
Respeito Shindô, como também Ozu e Ichikawa, diretores também japoneses, mas a abordagem destes é mais psicológica, beirando o cinema europeu. Portanto, se o nobre internauta afirma gostar de Truffaut e Godard se sentirá à vontade com A Ilha Nua.