domingo, 8 de junho de 2008

TO BE OR NOT TO BE


por Quatermass


“To be or not to be, that is the question!” Imortal frase shakesperiana lida e relida várias vezes, seja em livro, seja em teatro, seja por Hollywood. Desculpem Kenneth Branagh e Sir Lawrence Olivier, não é de seus filmes que passo a analisar, mas do universo Star Trek.


O diretor/roteirista Nicholas Meyer sempre enriqueceu o desgastado mundo de Gene Roddenberry. Se Jornada nas Estrelas tivesse se restringido à série clássica (1966-1969) e alguns longas sua contribuição teria sido meramente a título de curiosidade, supérflua até. Mas a partir dos anos setenta resolveram ganhar mais uma graninha em cima e bolaram quatro seriados baseados no original (Nova Geração, Deep Space Nine, Voyager e Enterprise) e dez filmes de longa metragem (Jornadas I, II, III, IV, V, VI, VII, VIII, IX e X). Haja fôlego! Mas também haja paciência, haja engov, haja compreensão dos fãs diante de tanta ladainha vazia e efeitos cansativos. Em Star Trek qualidade e quantidade são palavras acima de tudo antagônicas, inversamente proporcionais.



Desses resquícios de criatividade, sobressaem os longas. O primeiro, Jornada nas Estrelas – O Filme é uma space opera muito inspirada de Jerry Goldsmith, cuja história atribulada dos bastidores seria suficiente para um filme próprio de como não fazer cinema. Mas ainda assim, deve ser visto em separado dos demais nove, pois tirando o roteiro confuso (uma das causas das brigas) e orçamento/prazo estourados, a direção, efeitos especiais e, novamente, a esplêndida trilha sonora compensam e muito.


O segundo, A Ira de Khan, foi o resultado dos excessos do primeiro: orçamento controlado, prioridades para roteiro e personagens. Aí entra Nicholas Meyer. De tudo o que foi produzido nestes quase trinta anos, foi a única criatura lúcida capaz de compreender e criar ou ressuscitar idéias/conceitos novos, personagens/vilões novos e histórias interessantes. A relação de amor e ódio entre Kirk/Khan, a questão da idade-jovem/velho-novo/arcaico, a interação mais íntima entre os personagens, as cenas de ação, tudo de maneira racional e enxuta.



Daí vem o terceiro (1984), quarto (1986) e o terrível quinto Star Trek (1989), quando se torrou dinheiro, tempo e idéias, associadas a um diretor amador (o próprio Willian Shatner) e um produtor que já devia ter caído fora há muito tempo (Harve Bennett). Novamente volta o bombeiro Nicholas Meyer para apagar o incêndio e fazer o rescaldo.


E aí? Aí vem Jornada nas Estrelas VI – A Terra Desconhecida (1991), de novo com orçamento apertado e de idéias novas. O filme é inferior ao segundo, principalmente devido ao clima pós-guerra fria no mundo real – acompanhando a tendência, os Klingons já não são o Império do Mal. Será? Pois é nesse momento de transição, de apaziguamento, que surge um dos melhores vilões já bolados neste universo sci-fi: o General Chang.



Muitas vezes um filme é lembrado somente pelo herói, pelo monstro, pelo romance, pelo suspense, pelo diretor. Em Star Trek VI a figura lendária é o personagem de Christopher Plummer. Se Nicholas Meyer bolou o tipo, o ator deu o arremate que faltava. Chang era perverso, inteligente, sarcástico, irônico, cínico, empático, de presença marcante e, acima de tudo, apaixonado por Shakespiere! Para desgosto de Kirk, vivia recitando o dramaturgo inglês, conferindo momentos de raro humor espontâneo e charme, somente visto no seriado dos anos sessenta.


Este personagem também conferiu uma sobrevida à irregular série de longas metragens, inclusive, sendo personagem em jogos de computador, como Klingon Academy. Uma curiosidade: nos anos sessenta, apesar da guerra fria envolver oficialmente Estados Unidos e União Soviética, na ponte da Enterprise estava o navegador Checov, russo. Até aí tudo bem. Mas os Klingons tinham feições por demais asiáticas, tendendo para o chinês ou o mongol. Ou seja, Roddenberry puxou a Rússia como aliada contra a China de Mao Tse Tung, e se prestarem atenção no episódio The Omega Glory fica ainda mais evidente, onde mesmo não contando com os Klingons, o inimigo lembrava o Exército Popular da China.


Quando filmaram o primeiro longa, mudaram as feições dos Klingons, tornando-os mais aliens e menos humanos. Mas Chang é diferente: lembra Gengis Khan – é só reparar. Por que será que aconteceu este breve retrocesso? Shakespiere explica?


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